15 janeiro 2015

A mãe de Colombo

─ Tchau, mãe!
Há muito tempo ele esperava por esse dia. Já tinha feito outras viagens menores, mas nos últimos anos seu desejo de ir para a Índia tornou-se ideia fixa. Mal sabia ele que os ventos também têm suas teimosias e quando decidem mudar o rumo da história, o fazem mesmo. Colombo desenharia um novo continente nos mapas que estudava com extrema dedicação e que, no fim das contas, tiveram pouca serventia.
Vivia de forma austera, gastando somente o dinheiro necessário para manter as aparências de um cidadão comum. Todo o resto guardava para a viagem, embora seja de conhecimento geral ser impossível desvendar as infinitudes do oceano apenas juntando moedas. Fala-se do dinheiro porque é onde se concentra o interesse da maioria, mas Colombo também teve trabalho. Traçou muitos planos, calculou diversas rotas, estudou todas as estrelas conhecidas na época, passou noites em claro observando o calmo movimento das marés, conversou com pesquisadores que a história esqueceu, leu os clássicos gregos escondido da igreja e fez acordos comerciais com gente da mais alta classe de Portugal e Espanha  como todo menino pobre que um dia chegou ao topo.
Embora os planos de Colombo estivessem escancarados nas capas dos jornais, cabe a toda boa mãe fazer algumas perguntas ao filho quando ele se despede:
─ Vai aonde, meu filho?
─ Como assim, mãe? Estou indo para a Índia!
─ Não volta tarde, em?
─ Mãe, estou indo viajar. Lembra que eu te falei na semana passada?
─ Quem vai com você?
─ Vai o pessoal lá do trabalho.
─ Quem?
─ O Domenico, o João, o Giacomo...
─ Não gosto, desse Giacomo! Fica com umas brincadeiras bestas no mar...
─ Pelo amor de Deus, mãe... Eu já tenho 40 anos!
─ Já fez sua mala?
─ Já!
─ Deixa eu ver o que você colocou aí.
─ Mãe, agora não dá tempo. Eu já estou de saída.
─ Pegou blusa?
─ Peguei!
─ Pegou escova de dentes?
─ Peguei!
─ Pegou toalha?
─ Toalha?
─ É! Pegou a tolha?
─ Acho que sim, mãe... qualquer coisa alguém me empresta. Preciso ir!
─ Espera aí que eu vou pegar um salgadinho pra você comer no caminho...
─ Não precisa, mãe. O barco já está cheio de coisas, não cabe mais nada. Fica com Deus, tchau!

─ Não beija mais sua mãe, não?

Então Colombo se aproxima com certa pressa para beija-la, mas fica constrangido quando ela o abraça e diz em tom mais baixo que tome cuidado na viagem, que o ama e que volte logo. Olhando nos olhos, reforça que não fique de brincadeira no mar porque é perigoso.
─ Está certo, mãe! Pode ficar despreocupada.
Pendura a bolsa maior no pescoço, carrega ainda umas tantas tralhas na mão quando ouve um último pedido:
─ Manda uma mensagem assim que chegar lá, viu?

2 comentários:

  1. Só faltou ela alertar para o perigo de entrar um saruê no barco "Ele pode roer o casco e tudo vir a pique". Aí seria minha mãezinha amada Filo Marto frita, cuspida, escarrada.

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